Jonas voltou e foi um bocadinho de tudo: vagabundo, pistoleiro e o senhor que abriu a porta a um rapaz chamado Jota

Ainda outro dia o futebol celebrou os 14 anos daquele momento em que Deco saiu para entrar um tal de Messi, um rapazito argentino com um pé esquerdo porreiro. Esta noite, se os Europeus sub-17 e sub-19 conquistados e as boas exibições na formação servirem de provas, viveu-se um momento que se prevê especial: João Filipe, ou Jota, entrou na segunda parte por Jonas e jogou pela primeira vez com a equipa principal do Benfica. Os encarnados venceram o Sertanense por 3-0, na terceira eliminatória da Taça de Portugal, com golos de Rafa, Gedson e Jonas.

O Ajax de Frenkie de Jong vem aí, por isso Rui Vitória optou por mudar as coisas. Corchia estreou-se com a camisola do Benfica. Alfa Semedo foi testado a central. Samaris, que jogou apenas um minuto no campeonato (mais 29’ na Taça da Liga), regressou à equipa, com a braçadeira de capitão e o pé torto. E Jonas, o tal pistolas que anda ausente do faroeste pintado de verde, voltou a ser titular mais de cinco meses depois.

O desenho do ataque benfiquista foi mais ou menos assim: Gedson e Gabriel tinham liberdade para chegar à frente, em futebol apoiado ou arrancadas e diagonais para desequilibrar no espaço ou arrastar alguém; Zivkovic e Rafa apareciam muito por dentro; Corchia e Yuri Ribeiro eram alas e estacionavam bem perto da linha, dando largura à equipa; Jonas é meio vagabundo, associa-se com toda a gente, aparece na linha, gosta pouco de se dar à marcação, mas vai pisando todos os terrenos. O brasileiro não é, naturalmente, o Jonas de antigamente: mostra mais fome do que a serenidade do costume, a bola ainda não dança ao som da música daquelas botas.

O Sertanense foi fechando bem. Por vezes, mantinha os quatro defesas alinhados e próximos na zona central, aceitando a ajuda dos extremos para acompanharem os alas do Benfica. O ouro esteve aí muitas vezes.

Davou, com a camisola 10, mostrou, mais do que uma vez, que sofria pouco de ansiedade com a bola no pé, mesmo contra uma camisola vermelha que pesa. Paciente, tentou segurar sempre que possível para a equipa ganhar mais unidades perto da bola. O treinador João Manuel Pinto, que jogou no Benfica duas épocas no início do século XXI, pediu coragem antes do jogo. Aqui está um jogador corajoso, certamente.

A equipa da Sertã, que teve de jogar esta noite em Coimbra, segue na oitava posição da série C do Campeonato de Portugal, que é liderada pelo Vilafranquense, a primeira equipa que Rui Vitória treinou. A aventura na Taça, que chegou esta quinta-feira ao fim, teve três capítulos: nos dois anteriores venceram o Beneditense (2-0) e Sernache (3-1).

O Benfica, que ia falhando muito no passe e no toque (não ajuda Samaris estar na zona 6, a pensar o jogo), precisou de 25 minutos para chegar com qualidade perto da baliza de Rafa Santos. Houve bom movimento, arrastamento, bom toque de bola e ruptura na linha, mas o cruzamento de Rafa saiu muito largo. A partir daqui, os encarnados começaram a bater à porta da baliza rival. Rafa, por cima da barra, Zivkovic ao lado e Jonas, sozinho dentro da área, ameaçaram o golo. A resistência durou, mais coisa menos coisa, 35 minutos: Yuri cruzou, Zivkovic rematou, Rafa Santos defendeu, mas Rafa, veloz, aproveitou a recarga para fazer o um-zero.

Começavam a surgir os espaços. Os homens da casa, que não são daquela casa, iam chegando mais tarde à bola e já apresentavam muitas dificuldades para sair em contra-ataque. O campo parecia estar maior. Perspectivava-se uma segunda parte complicada.

Nos segundos 45 minutos houve um bocadinho de tudo. Facundo Ferreyra entrou pelo apagado Gabriel, empurrando Jonas para o papel definitivo de vagabundo.

Gedson foi aparecendo mais à medida que o tempo passava e, completamente à vontade de pressão alheia, deu uma sacudidela no jogo, com uma bomba de longe: 2-0 (53’). Svilar também teve direito aos seus segundos de fama, depois de Hugo Barbosa, um dos destaques deste Sertanense, rematar em jeito, a uns metros da grande área. O belga voou, empurrou a bola para canto e segurou o zero que mora do outro lado do marcador.

João Félix entrou aos 67’ para, dois minutos depois, ver de perto o regresso aos golos de Jonas, na sequência de um belo movimento associativo de Yuri Ribeiro. O avançado brasileiro não marcava desde a última jornada do campeonato passado, a 13 de maio.

“Clap, clap, clap” e um burburinho. Foi isto que se ouviu quando Rui Vitória chamou Jota, o menino da camisola 73. Jonas saiu aos 77' e abriu a porta a uma das maiores esperanças do clube lisboeta.

A coincidência das coincidências é que o Benfica visita na próxima semana a casa de Johan Cruyff, o mítico Ajax, conhecido pela aposta na prata da casa, com uma identidade reconhecida em todo o mundo e com um jogo fluído, técnico e muito atrativo. Talvez por isso, ou talvez seja apenas um acaso feliz, este Benfica terminou este duelo da terceira eliminatória da Taça com Rúben Dias, Alfa Semedo, Yuri Ribeiro, Gedson, João Félix e Jota.


FONTE: TribunaExpresso